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O incêndio de Roma
Talvez o cristianismo não se
expandisse de maneira tão bem-sucedida, caso o Império Romano não tivesse
existido. Podemos dizer que o império era um tambor de gasolina à espera da
faísca da fé cristã.
Os elementos unificadores do império ajudaram na
expansão do evangelho. Com as estradas romanas, as viagens ficaram mais fáceis
do que nunca. As pessoas falavam grego por todo o império e o forte exército
romano mantinha a paz. O resultado da facilidade de locomoção foi a migração de
centenas de artesãos, por algum tempo, para cidades maiores — Roma, Corinto,
Atenas ou Alexandria — e depois se mudavam para outro lugar. O cristianismo
encontrou um clima aberto à religiosidade. Em um movimento do tipo Nova Era,
muitas pessoas começaram a abraçar as religiões orientais — a adoração a Isis,
Dionisio, Mitra, Cibele e outros. Os adoradores buscavam novas crenças, mas
algumas dessas religiões foram declaradas ilegais por serem suspeitas de
praticar rituais ofensivos. Outras crenças foram oficialmente reconhecidas,
como aconteceu com o judaísmo, que já desfrutava proteção especial desde os
dias de Júlio César, embora seu monoteísmo e a revelação bíblica o colocassem à
parte das outras formas de adoração.
Tirando plena vantagem da situação,
os missionários cristãos viajaram por todo o império. Ao compartilhar sua
mensagem, as pessoas nas sinagogas judaicas, nos assentamentos dos artesãos e
nos cortiços se convertiam. Em pouco tempo, todas as cidades principais tinham
igrejas, incluindo a capital imperial.
Roma, o centro do império, atraía pessoas como um ímã.
Paulo quis visitar Roma (Rm 1.10-12), e, na época em que escreveu sua carta à
igreja romana, vemos que ele já saudava diversos cristãos romanos pelo nome (Rm
16.3-15), talvez porque já os tivesse encontrado em suas viagens.
Paulo chegou a Roma acorrentado. O
livro de Atos dos Apóstolos termina narrando que Paulo recebia convidados e os
ensinava em sua casa, onde cumpria pena de prisão domiciliar, ainda que, de
certa forma, não vigiada.
A tradição também diz que Pedro
passou algum tempo na igreja romana. Embora não tenhamos números precisos,
podemos dizer que, sob a liderança desses dois homens, a igreja se fortaleceu,
recebendo tanto nobres e soldados quanto artesãos e servos.
Durante três décadas, os oficiais
romanos achavam que o cristianismo era apenas uma ramificação do judaísmo — uma
religião legal — e tiveram pouco interesse em perseguir a nova
"seita" judaica. Muitos judeus, porém, escandalizados pela nova fé,
partiram para o ataque, tentando inclusive envolver Roma no conflito.
O descaso de Roma pela situação pode
ser visto no relato do historiador romano Tácito. Ele relata uma confusão entre
os judeus, instigada por um certo "Chrestus", ocorrida em um dos
cortiços de Roma. Tácito pode ter ouvido errado, mas parece que as pessoas
estavam discutindo sobre Christos, ou seja, Cristo.
Por volta de 64 d.C, alguns oficiais
romanos começaram a perceber que o cristianismo era substancialmente diferente
do judaísmo. Os judeus rejeitavam o cristianismo, e cada vez mais pessoas viam
o cristianismo como uma religião ilegal. A opinião pública pode ter começado a
mudar em relação à fé nascente até mesmo antes do incêndio de Roma. Embora os
romanos aceitassem facilmente novos deuses, o cristianismo não estava disposto
a partilhar a honra com outras crenças. Quando o cristianismo desafiou o
politeísmo tão profundamente arraigado de Roma, o império contra-atacou.
Em 19 de julho, ocorreu um incêndio
em uma região de trabalhadores de Roma. O incêndio se prolongou por sete dias,
consumindo um quarteirão após o outro dos cortiços populosos. De um total de
catorze quarteirões, dez foram destruídos, e morreram muitas pessoas.
A lenda diz que o imperador romano
Nero "dedilhava" um instrumento musical, enquanto Roma era destruída
pelas chamas. Muitos de seus contemporâneos achavam que Nero fora o responsável
pelo incêndio. Quando a cidade foi reconstruída, mediante o uso de altas somas
do dinheiro público, Nero se apoderou de grande uma extensão de terra e
construiu ali os Palácios Dourados. O incêndio pode ter sido a maneira rápida
de renovar a paisagem urbana.
Objetivando desviar a culpa que
recaíra sobre si, o imperador criou um conveniente bode expiatório: os
cristãos. Eles tinham dado início ao incêndio, acusou o imperador. Como
resultado, Nero jurou perseguir e matar os cristãos.
A primeira onda da perseguição romana
se estendeu de um período pouco posterior ao incêndio de Roma até a morte de
Nero, em 68 d.C. Sua enorme sede por sangue o levou a crucificar e queimar
vários cristãos cujos corpos foram colocados ao longo das estradas romanas,
iluminando-as, pois eram usados como tochas. Outros vestidos com peles de
animais, eram destroçados por cães nas arenas. De acordo com a tradição, tanto
Pedro quanto Paulo foram martirizados na perseguição de Nero: Paulo foi
decapitado, e Pedro foi crucificado de cabeça para baixo.
Entretanto, a perseguição ocorria de
maneira esporádica e localizada. Um imperador podia intensificar a perseguição
por dez anos ou mais; mas um período de paz sempre se seguia, o qual era
interrompido abruptamente quando um governador local resolvia castigar
novamente os cristãos de sua área, sempre com o aval de Roma. Esse padrão se
prolongou por 250 anos.
Tertuliano, escritor cristão do
século li, disse: "O sangue dos mártires é a semente da igreja". Para
surpresa geral, sempre que surgia perseguição, o número de cristãos a ser
perseguido aumentava. Em sua primeira carta, Pedro encorajou os cristãos a
suportar o sofrimento, confiantes na vitória derradeira e no governo divino que
seria estabelecido em Cristo (lPe 5.8-11). O crescimento da igreja sob esse
tipo de pressão provou, em parte, a veracidade dessas palavras.