312
A conversão de Constantino
Era o mês de outubro do ano 312. Um
jovem general, a quem todas as tropas romanas da Bretanha e da Gália eram
fiéis, marchava em direção a Roma para desafiar Maxêncio, outro postulante ao
trono imperial. Segundo o relato da história, o general Constantino olhou para
o céu e viu um sinal, uma cruz brilhante, na qual podia ler: "Com isto
vencerás". O supersticioso soldado já estava começando a rejeitar as
divindades romanas a favor de um único Deus. Seu pai adorava o supremo deus
Sol. Seria um bom presságio daquele Deus na véspera da batalha?
Mais tarde, Cristo teria aparecido a
Constantino em um sonho, segurando o mesmo sinal (uma cruz inclinada),
lembrando as letras gregas chi (c) e rho (r), as duas primeiras letras da palavra Christos. O
general foi instruído a colocar esse sinal nos escudos de seus soldados, o que
fez prontamente, da forma exata como fora ordenado.
Conforme prometido, Constantino
venceu a batalha.
Esse foi um dos diversos momentos
marcantes do século iv, um período de violentas mudanças. Se você tivesse saído
de Roma no ano 305 d.C. para viver anos no deserto, quando voltasse certamente
esperaria encontrar o cristianismo morto ou enfrentando as últimas ondas de perseguição.
Em vez disso, o cristianismo se tornou a religião patrocinada pelo império.
Depois de ter tomado o poder em 284, Diocleciano, um
dos mais brilhantes imperadores romanos, começou uma enorme reorganização que
afetaria as áreas militar, econômica e civil. Durante certo período de tempo,
ele deixou o cristianismo em paz.
Uma das grandes idéias de Diocleciano foi a
reestruturação do poder imperial. Dividiu o império em Oriente e Ocidente, e
cada lado teria um imperador e um vice-imperador (ou césar). Cada imperador
serviria por vinte anos e, a seguir, os césares assumiriam também por vinte
anos e assim por diante. No ano 286, Diocleciano indicou Maximiano imperador do
Ocidente, enquanto ele mesmo continuava a governar o Oriente. Os césares eram
Constancio Cloro (pai de Constantino) no Ocidente e Galério no Oriente.
Galério era radicalmente anticristão (há informações que ele
atribuiu a perda de uma batalha a um soldado cristão que fez o sinal da cruz).
É bem provável que o imperador do Oriente tenha assumido posições anticristãs
por instigação de Galério. Tudo isso era parte da reorganização do império, de
modo que a lógica era a seguinte: Roma tinha uma moeda única, uní sistema
político único e, portanto, deveria ter uma única religião; os cristãos, porém,
estavam em seu caminho.
A partir do ano 298, os cristãos
foram retirados do exército e do serviço civil. Em 303, a grande perseguição
teve início. As autoridades planejaram impor severas sanções sobre os cristãos,
que começariam a ser implantadas na Festa da Termi-nália, em 23 de fevereiro.
As igrejas foram arrasadas, as Escrituras confiscadas, e as reuniões proibidas.
No início, não houve derramamento de sangue, mas Galério logo se encarregou de
mudar essa situação. Quando Diocleciano e Maximiano deixaram seus postos (de
acordo com o planejado), em 305, Galério desencadeou uma perseguição ainda mais
brutal. De modo geral, Constantino, que governava o Ocidente, era mais
indulgente. Porém, as histórias de horror do Oriente eram abundantes. Até o ano
310, a
perseguição tirou a vida de muitos cristãos.
Contudo, Galério foi incapaz de esmagar a igreja.
Estranhamente, em seu leito de morte, ele mudou de idéia. Em outro grande
momento, no dia 30 de abril de 31 1, o feroz imperador desistiu de lutar contra
o cristianismo e promulgou o Édito de Tolerância. Sempre político,
insistiu em que fizera tudo para o bem do império, mas que "grande
número" de cristãos "persiste em sua determinação". Desse modo,
agora era melhor permitir que eles se encontrassem livremente, contanto que não
atentassem contra a ordem pública. Além disso, declarou: "Será tarefa
deles orar ao seu Deus em benefício de nosso Estado". Roma precisava de
toda a ajuda que pudesse obter. Galério morreu seis dias depois.
O grande plano de Diocleciano, no
entanto, começava a ruir. Quando Constancio morreu, no ano 306, seu filho
Constantino foi proclamado governador por seus soldados leais. Maximiano,
porém, tentou sair do exílio e governar o Ocidente outra vez com o filho,
Maxêncio (que terminou tirando o próprio pai do poder). Enquanto isso, Galério
indicava um general de sua confiança, Licínio, para governar o Ocidente. Cada
um desses futuros imperadores reivindicava um pedaço do território ocidental.
Eles teriam de lutar por ele. Constantino, de maneira astuta, forjou uma
aliança com Licínio e lutou contra Maxêncio. Na batalha da Ponte Mílvia,
Constantino saiu vitorioso.
Naquele momento, Constantino e Licínio montaram um
delicado equilíbrio de poder. Constantino estava ansioso para agradecer a
Cristo por sua vitória e, desse modo, optou por dar liberdade e status à
igreja. No ano 313, ele e Licínio emitiram oficialmente o Edito de Milão, garantindo
a liberdade religiosa dentro do império. "Nosso propósito", dizia o
édito, "é garantir tanto aos cristãos quanto a todos os outros a plena
autoridade de seguir qualquer culto que o homem desejar".
Constantino, imediatamente, assumiu o
interesse imperial pela igreja: restaurou suas propriedades, deu-lhe dinheiro,
interveio na controvérsia donatista e convocou os concilios eclesiásticos de
Arles e de Nicéia. Ele também fazia manobras para obter poder sobre Licínio, a
quem finalmente depôs, em 324.
Assim, a igreja passou de perseguida
a privilegiada. Em um período de tempo surpreendentemente curto, suas
perspectivas mudaram por completo. Depois de séculos como movimento
contracultural, a igreja precisava aprender a lidar com o poder. Ela não fez
todas as coisas de maneira correta. A própria presença dinâmica de Constantino
modelou a igreja do século iv, modelo que ela adotou daí em diante. Ele era um
mestre do poder e da política, e a igreja aprendeu a usar essas ferramentas.
A visão de Constantino foi autêntica ou ele foi apenas
um oportunista, que usou o cristianismo para benefício próprio? Somente Deus
conhece a alma. Embora tenha falhado na demonstração de sua fé em várias
ocasiões, o imperador certamente assumiu um interesse ativo no cristianismo que
professava, chegou até mesmo a correr risco pessoal em certos momentos.
Ε certo que Deus usou Constantino
para fazer com que as coisas acontecessem para a igreja. O imperador afirmou e
assegurou a tolerância oficial à fé. Ao fazer isso, porém, ele seguiu os passos
do moribundo Galério. Assim, a batalha contra a perseguição romana foi vencida,
em certo sentido, não na ponte Mílvia, mas nas arenas em que os cristãos
entraram para enfrentar bravamente a morte.