Gregorio I se torna papa
Embora não fosse mais a capital do
império, Roma ainda possuía prestígio. Além do mais, a antiga cidade tinha
ligações com os apóstolos Pedro e Paulo.
Por muitos anos, os bispos de Roma
tentaram expandir o poder que conquistaram. Paulatinamente, a cidade alcançou
posição de proeminência sobre as outras dioceses, e o bispo
de Roma se tornou o papa.
Contudo, o homem que mais contribuiu
para o incremento da autoridade e do poder do papado não fez isso buscando o
ganho político. O humilde monge, que não procurava altos postos, chegou ao papado
contra a própria vontade.
Gregorio nasceu em 540 de uma nobre
família romana, que possuía uma história relacionada a serviços prestados na
esfera política. Ele se tornou chefe da prefeitura de Roma, o mais alto cargo
civil. Porém, não se sentia talhado para a vida pública e acabou renunciando,
dividindo suas propriedades para a fundação de mosteiros, vindo a se unir a um
deles posteriormente. Alguns anos mais tarde, ele mesmo se tornaria abade.
Sua piedade e, sem dúvida, seu
passado de administrador habilidoso atraíram a atenção das pessoas. Em 590,
quando o papa morreu, os romanos, de maneira unânime, pediram a Gregorio que se
tornasse seu sucessor. Embora Gregorio se recusasse a fazê-lo, a vontade
pública prevaleceu.
Como já fora um homem de Estado, o novo
papa transpôs sua habilidade de governar para seu novo ofício. Quando os
lombardos ameaçaram Roma, Gregorio pediu ajuda ao imperador em Constantinopla.
Como esse apoio não chegou, o bispo de Roma reuniu as tropas, negociou tratados
e fez tudo o que era necessário para promover a paz. As ações independentes de
Gregorio provaram ao exarca do imperador (seu representante que estava em
Rave-na), que o papa era bastante capaz para manter a ordem em Roma. Esses
movimentos políticos se tornariam uma espécie de primeiros passos para a
divisão dos cristãos nos impérios do Oriente e do Ocidente.
Gregorio, porém, não tinha ambições
políticas. Seus interesses eram espirituais. Extremamente preocupado com o
cuidado pastoral, insistia em que o clero
visse a si mesmo como um grupo de pastores e servos do rebanho. Dizia
que era "servo dos servos de Deus", e sua obra intitulada Livro do cuidado pastoral — um estudo maravilhosamente criterioso
sobre as provações espirituais das pessoas e a maneira pela qual o clero
deveria lidar com elas — tornou-se uma espécie
de livro-texto ministerial da Idade Média.
Outra obra sua,
Diálogos, foi a primeira tentativa de hagiografía — biografia dos santos — que enfatizava o
fantástico e o miraculoso, o que acabou por transformar os santos em uma
espécie de super-heróis da época. Durante seu papado, a veneração de partes do
corpo, de roupas e de outros pertences dos santos foi encorajada, e isso viria
a se transformar em uma das principais características da piedade medieval. Por
vários séculos, nenhuma igreja poderia se estabelecer se não tivesse alguma
relíquia de um santo para ser colocada nela.
Embora Gregorio não afirmasse ser
teólogo, algumas de suas crenças se tornaram essenciais para a teologia
católica. Ele acreditava no purgatório e ensinava que as missas celebradas a
favor dos mortos poderiam aliviar as dores dos que estavam naquele local. Além
disso, ajudou a popularizar o ensino de Dionisio Areopagita, que escreveu sobre
diversas categorias de anjos. Depois de Gregorio, essas idéias se tornariam
grandemente aceitas.
Embora não tenha sido ele o criador
do canto gregoriano, Gregorio era bastante interessado na música da igreja (o
cantochão deve muito à sua influência).
Além disso, Gregorio autorizou uma
missão evangelística à região de Kent, liderada por Agostinho, o missionário
que, mais tarde, se tornaria o primeiro arcebispo da Cantuária. Embora o
cristianismo já tivesse alcançado a Bretanha, ao enviar essa missão sob a
liderança de Agostinho, o papa estava estendendo o poder de Roma àquelas ilhas.
O cristianismo, que tinha em Roma sua liderança, começava a tomar forma.
O bispo de Constantinopla afirmava
ser o Patriarca Ecumênico (no sentido de "universal" ou
"global").
Gregorio tanto se recusou a aceitar o
uso desse título quanto o rejeitou para si mesmo. Tudo o que fez, porém,
mostrou que Gregorio via a si mesmo como o pastor-chefe de uma igreja mundial.
Em um espaço de 14 anos, Gregorio
realizou tantos feitos que as gerações posteriores o denominavam de Gregorio, o
Grande. Talvez ele tenha se tornado grande por ter sido um homem humilde.