domingo, 2 de setembro de 2012

988 CONVERSÃO DE VLADIMIR, PRÍNCIPE DA RÚSSIA


988

Conversão de Vladimir, príncipe da Rússia

A conversão de um governante pagão, amante do divertimento, efetivamente levou o cristianismo à Rússia. Embora o cristianismo já tivesse alcançado a Rússia na primeira parte do século X, não foi aceito de maneira geral. Em 957, Olga, a princesa viúva de Kiev, foi batizada. Ela pediu a Oto I o rei germânico, que enviasse missionários a seu país, mas eles provavelmente tiveram pouco sucesso, pois a religião paga prevaleceu.
Vladimir, neto de Olga, estava entre aqueles pagaos. Ele construiu diversos templos, atraindo fama para si mesmo em função de sua crueldade e de sua falta de lealdade. Ele tinha oitocentas concubinas e cinco esposas e, quando não estava lutando em alguma guerra, caçava e festejava. Ninguém o escolheiia como o homem que levaria o cristianismo ao seu povo.
Como a maioria dos governantes, Vladimir queria manter seu povo alegre. Ele percebeu que poderia fazer isso unificando-os pela religião. Desse modo, conta-se que enviou diversos homens para examinar as principais religiões. Com suas regras de alimentação restritivas, nem o islã nem o judaísmo agradaram ao príncipe, de modo que ele teve de escolher entre o cristianismo romano e a igreja do Oriente.
Depois de comparecer a um culto na Igreja da Santa Verdade, em Cons-tantinopla, os homens de Vladimir apresentaram o seguinte relato: "Não sabíamos se estávamos no céu ou na terra, pois certamente não existe tamanho esplendor ou beleza em qualquer lugar aqui na terra. Não somos capazes de descrever o que vimos. Sabemos apenas que Deus habita entre aqueles homens e que seu culto ultrapassa em muito a adoração de todos os outros lugares. É impossível esquecer aquela beleza".
De acordo com a história, devido a essa beleza, Vladimir optou pela ortodoxia. É verdade que essa era a religião da nação vizinha, mais poderosa, rica e civilizada: o Império Bizantino. Quando a irmã do imperador bizantino, Basilio, foi-lhe oferecida em casamento, Vladimir aceitou, o que ajudou ainda mais a consolidar sua posição junto ao vizinho.
Em 988, Vladimir foi batizado e, um ano depois, casou-se com Ana, mas nenhuma das duas atitudes foi uma mostra de que ele estava se submetendo ao Império Bizantino.
A escolha de Vladimir deixa claro que a igreja russa se concentrava no culto de adoração. A ortodoxia oriental sempre teve um apelo estético. O nome da religião escolhida pelo príncipe, pravoslavie, significava "verdadeira adoração" ou "a glória apropriada". Para a mente russa, o cristianismo significa liturgia.
Depois do batismo de Vladimir, sem muitas dificuldades, o povo colocou de lado as velhas religiões. Embora a Rússia não tenha se tornado uma nação cristã da noite para o dia, as coisas começaram a mudar. Em um primeiro momento, as conversões em massa não aconteceram, mas, com a ajuda dos monges — sempre uma força de primeira grandeza na ortodoxia oriental —, a nova religião começou a fazer com que sua influência fosse sentida.
Graças a Metódio e Cirilo, a Rússia tinha uma liturgia cristã em sua própria língua (o idioma eslavônico). As pessoas podiam participar e entender maravilhosa liturgia nas belíssimas igrejas construídas por Vladimir e seus sucessores.
A conversão de Vladimir claramente influenciou seu estilo de vida. Ao se casar com Ana, deixou as outras cinco esposas. Destruiu também os ídolos, protegeu os oprimidos, criou escolas e igrejas e viveu em paz com as nações vizinhas. Em seu leito de morte, doou todas as suas posses aos pobres. A igreja grega terminou por canonizá-lo.

909 UM MOSTEIRO É ESTABELECIDO EM CLUNY


909

Um mosteiro é estabelecido em Cluny

Nos séculos IX e X, a igreja estava doente. As lutas políticas causaram várias divisões na Europa. Os líderes da igreja buscavam poder e terras, praticavam violência e engano, assim como favoreciam o comportamento libertino. Em nada diferiam dos déspotas seculares.
Guilherme (William), o Pio, duque de Aquitânia, fundou um mosteiro em Cluny, que seria uma sociedade independente, livre das lutas de poder do império, sob a proteção do papa. O mosteiro seguiria a Regra estabelecida por Bento de Núrsia nos anos de 500: pobreza, castidade e obediência. A Regra foi bem recebida. Expoentes como Gregorio Magno e Carlos Magno promoveram essa idéia e ela se espalhou rapidamente por todo o império no século IX. Ela, porém, nunca conseguiu criar raízes, a não ser em Cluny.
Uma série de líderes capacitados fez com que Cluny funcionasse adequadamente: Berno, Odo, Majólo, Odilo, Hugo. Sob a orientação desses homens, novos mosteiros surgiram na França, Itália e Alemanha, os quais eram considerados "filhos" de Cluny. Alguns mosteiros já existentes procuraram a ajuda de Cluny. Em uma era feudal, Cluny se tornou o centro de um feudo espiritual. Esse mosteiro acumulava um poder muito além de sua idéia original. Porém, o tempo era adequado para um movimento de reforma, e Cluny carregava essa bandeira. Aquele foi o lugar em que se ergueu a maior edificação do cristianismo ocidental até a construção da Basílica de São Pedro, em Roma. Por volta do ano 1110, Cluny liderava cerca de dois mil mosteiros.
O movimento monástico teve e-feito reformador sobre a igreja. Os monges exemplificavam e promoviam o comportamento cristão. O sacerdócio foi melhorado à medida que monges cluniacenses se tornaram bispos e até mesmo papas. Cluny se colocou terminantemente contra a simonía — a compra de ofícios sarce-dotais — e o nicolaísmo — o ato de os sacerdotes tomarem para si concubinas e esposas.
Cluny, no entanto, também conseguiu aparar uma série de arestas da sociedade secular. A classe dos cavaleiros começou a desenvolver a bravura cristã. A promoção por parte de Cluny de uma "Trégua Divina" — que afirmava que era ilegal guerrear da noite de quinta-feira até a manhã de segunda-feira — de algum modo limitava as contendas mesquinhas entre os nobres, embora o édito, aparentemente, não se aplicasse às batalhas contra os infiéis. Uma vez que o papa Urbano π fora prior em Cluny, a influência desse mosteiro pode ter sido responsável, de alguma maneira, pelas primeiras Cruzadas.
O poder de Cluny alcançou seu ápice sob o abade Hugo (1049-1109). Quando esteve sob a direção de Pedro, o Venerável (que serviu ali de 1122 a 1156), as coisas começaram a declinar. O poder pode ter levado Cluny à direção oposta da simplicidade de Bento. A ordem cisterciense, de Bernardo, mais tarde renovaria a força espiritual da igreja.

CIRILO E METÓDIO EVANGELIZAM OS ESLAVOS


863

Cirilo e Metódio evangelizam os Eslavos



Séculos antes de Michelangelo, ou das aulas ilustradas no quadro-ne-gro, um missionário com dons artísticos pintou em uma parede um quadro do Juízo Final e ganhou o rei para Cristo.
A história nos conta que o artista era Metódio, que também era monge e missionário. O monarca era o rei Boris da Bulgária. Metódio, com seu irmão Cirilo, tiveram uma carreira digna de nota. Entre suas façanhas, eles levaram a fé cristã aos eslavos e, durante o processo, fizeram muito para transformar e preservar a cultura daquele povo. A igreja que mais tarde produziu Hus, Comênio e muitos seguidores que foram atraídos pela revolução espiritual de Zinzendorf, começou com esses dois irmãos gregos da cidade de Tessalônica.
Os dois eram clérigos dedicados. Metódio, o mais velho, foi abade de um mosteiro grego. Cirilo (também conhecido como Constantino), professor de filosofia em Constantinopla, já estivera em missão aos árabes. Em 860, eles uniram forças para evangelizar a tribo cazar, a nordeste do mar Negro.
As tensões entre o Oriente e Ocidente já eram fortes quando Roma disputava com Constantinopla o controle religioso e político dos territórios fronteiriços. Quando Ratislau, governador do grande Estado morá-vio (um desses territórios longínquos) ficou preocupado com a intromissão dos francos e dos germanos sobre o povo eslavo, ele se voltou para o Oriente. Apelou para o imperador de Constantinopla, Miguel m, pedindo que enviasse ajuda — e missionários. Foi assim que o chamado alcançou Cirilo e Metódio.
Chegando em 863, os irmãos rapidamente aprenderam a língua nativa e começaram a traduzir as Escrituras e a liturgia da igreja para o idioma eslavônico. Cirilo inventou um novo alfabeto baseado nas letras gregas, que se tornou a base para o alfabeto russo. (O "cirílico" é usado ainda atualmente por alguns povos).
Séculos antes de Wycliffe, Hus ou Lutero, a idéia de um culto de adoração celebrado em outra língua que não fosse o latim ou o grego chocava muitas pessoas. O arcebispo alemão de Salzburgo criou enorme rebuliço, provavelmente motivado mais pela política que pela piedade. A igreja romana não podia ficar passiva enquanto o território morávio, vizinho às suas propriedades, estava sendo orientalizado. Cirilo e Metódio foram para Roma em 868 a fim de defender sua posição da adoração autóctone. O papa Adriano II concordou com Cirilo e Metódio, autorizando a liturgia eslava. Os dois se tornaram monges romanos. Cirilo morreu no ano seguinte, mas Metódio retornou à Morávia como bispo. Embora fosse um emissário oficial do papa, os clérigos germanos o prenderam e o mantiveram na cadeia por três anos. O papa seguinte, João vm, interveio a seu favor e ratificou a independência da igreja eslava. Metódio, no entanto, continuou a enfrentar a oposição dos clérigos germânicos até sua morte em 885.
Pouco depois, a liturgia latina substituiu a eslava, e a igreja naquela área declinou. Porém, uma forte corrente libertária da fé cristã tinha se espalhado. Apesar de seus problemas, Cirilo e Metódio estabeleceram uma tradição cristã na Morávia e nos países vizinhos que alimentou e espalhou a fé por todo o mundo.

800 CARLOS MAGNO É COROADO IMPERADOR


800


Carlos Magno é coroado imperador



A igreja e o Estado deveriam se unir?
No mundo antigo, todo Estado tinha deuses próprios, e o imperador romano era um deles. Ninguém separava a religião da política. Quando Constantino se converteu e levou o cristianismo ao império na condição de religião protegida, essa prática foi adotada pela igreja.
Mesmo depois da queda do império, muitas pessoas se apegaram à idéia de que deveria haver um império cristão. Mas quem seria seu líder? Seria um líder espiritual, o papa, ou a autoridade deveria ficar nas mãos de um rei? Durante a Idade Média, os líderes buscariam as respostas para essas perguntas.
Contudo, na metade do século viu, o papado já era bastante forte, mas ainda não tinha alcançado o objetivo de restaurar a ordem no mundo ocidental. Em 754, um documento forjado, denominado a Doação de Constantino, tentaria manter viva a idéia de um Império Romano. De acordo com a Doação, o imperador romano Constantino se mudara para Constantinopla a fim de permitir que o papa controlasse o Ocidente. Constantino teria deixado propositadamente essa parte do império nas mãos do bispo de Roma.
Seguindo as idéias da Doação de Constantino, o rei franco Pepino 111, filho de Carlos Martelo, decidiu tomar Ravena da mão dos lombardos e a entregou ao papa. Em 756, a Doação de Pepino passava às mãos do papa as terras que, mais tarde, seriam conhecidas por Estados papais.
Embora o papa tivesse recebido territórios, ele nunca alcançou, de forma direta, o controle imperial. Este ficaria nas mãos do filho de Pepino, Carlos Magno.
Ao assumir o trono, em 771, Carlos Magno deu início a três décadas de conquistas. Ele expandiu as fronteiras de seu reino para o leste e, no final do seu reinado, controlava a maior parte da Itália, a Borgonha, a Alemanha, a Bavária e a Turgínia. No lado norte, tinha poder sobre a Saxônia e a Frísia. A leste dessas regiões, criou territórios com organizações militares especiais chamadas marches. Elas se estendiam do mar Báltico ao Adriático. Pela primeira vez, considerável parte da Europa possuía liderança estável.
Até o Natal do ano 800, Carlos Magno possuía o título de "rei". Naquela data, o papa Leão u o coroou imperador. Mais uma vez, parecia que a Europa Ocidental tinha um imperador para seguir os passos de Constantino.
Carlos Magno levou a sério a idéia de que ele se tornara um imperador cristão, pois todos os seus despachos oficiais se iniciavam da seguinte maneira: "Carlos, pela vontade de Deus, imperador romano".
A imagem do novo imperador era impressionante: alto, forte, grande cavaleiro, lutador destemido e, em alguns momentos, cruel. Ele concedeu à Europa uma figura paterna poderosa, mas benevolente.
Carlos Magno não queria perder seu poder de forma alguma. O imperador de Constantinopla não representava qualquer tipo de problema, pois reconheceu oficialmente os direitos de Carlos Magno. Contudo, os que permaneciam sob seu poder e até mesmo o papa poderiam querer tirar um pouco da sua autoridade. Como seu império era bastante amplo, Carlos Magno indicou um grupo de oficiais conhecidos por missi dominici. Esses homens viajavam pelo império para verificar como estavam os oficiais locais. Nem mesmo o papa conseguiria esconder-se de seus olhos atentos, e os missi dominici tinham autoridade sobre a igreja e o Estado.
Embora possuísse pouca instrução, Carlos Magno tinha alta estima pelo conhecimento. Sob seu governo pacífico, aconteceu um despertamento da arte e da erudição, conhecido por Renascimento carolíngio. O imperador patrocinou uma escola palaciana em Aachen. Alcuíno, brilhante estudioso anglo-saxão, foi professor ali. Ele exortava seus estudantes com as seguintes palavras: "Os anos correm como água. Não desperdicem os anos do aprendizado com a indolência". Alcuíno escreveu livros textos sobre gramática, ortografia, retórica e lógica. Escreveu também comentários bíblicos e assumiu o lado ortodoxo em muitos debates teológicos.
A escola de Aachen não apenas estimulou a instrução por todo o império, mas levou Carlos Magno a decretar que todo mosteiro deveria ter uma escola na qual se ensinasse "todos os que, com a ajuda de Deus, fossem capazes de aprender".
O Renascimento carolíngio preservou muitos escritos do mundo antigo. Como os monges faziam copias de obras latinas antigas — algumas delas maravilhosamente ilustradas — os mosteiros se tornaram "bancos culturais". Em muitos casos, sem o trabalho desses monges, as obras antigas teriam sido perdidas.
Em uma era de confusão e de guerra, o governo de Carlos Magno forneceu a necessária estabilidade política e incentivou a cultura. Ele assegurou que o Ocidente manteria o legado de sua cultura antiga, que o cristianismo se espalharia pelo império e que o clero pregaria sobre os elementos básicos da fé. Também deu sua proteção ao papa.
Carlos Magno, porém, não via razão para dar ao papa seu poder. Afinal, ele não fora um imperador cristão cuja lealdade máxima era devida a Deus? Na verdade, essa figura formidável não se submeteu a mais ninguém, senão a Deus.
Quando Carlos Magno morreu, em 814, seu império começou, gradualmente, a se desintegrar. Foi dividido entre seus três filhos, e lentamente o papa ganhou cada vez mais poder.
Carlos Magno, no entanto, legou ao Ocidente uma visão fascinante: um rei cristão com autoridade suprema sobre todos os seus domínios. Por centenas de anos, os papas e os reis buscariam esse controle sobre seus territórios — assim como sobre o território dos outros. Foi uma idéia que levou muito tempo para morrer.

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